08/01/2009

Sobre chatos, chatices e chateações



“Esse mundo é redondo, mas está ficando muito chato.”
Barão de Itararé



O cara que puxa o saco do chefe; o marido, com seus arrotos e flatulências; a esposa, com suas reclamações das crianças e fofocas dos vizinhos; crianças malcriadas, birrentas e mimadas; cachorro do vizinho, que late a noite toda; amigo que faz piada de tudo, a qualquer momento; sujeito permanentemente mal humorado, pronto para lançar farpas aos amigos e detonar os inimigos; reuniões de qualquer tipo e em qualquer lugar; pessoas maldosas, invejosas, são todos criaturas de condutas irritantes, repetitivas, maçantes, inconvenientes, que vivem invadindo a privacidade alheia, atazanando a vida dos outros, testando nossa paciência, vampirizando nossa energia vital.

Ocupar um longo tempo ao telefone para falar, falar, e nada dizer, ou para falar mal da vida alheia, é coisa de chato. Ou, ainda, entulhar nossa caixa postal de e-mails que só ele gosta, embora seja um ato chato, nem sempre pode ter essa intenção e nem sempre vem de uma personalidade chata. Mas, há a suspeita de esse tipo de ato vir de uma vida chatinha ou de um momento de vida extremamente chato.

Como vivemos numa época que demanda rapidez em tudo, as pessoas tendem a considerar chata uma pessoa ou situação que toma nosso tempo em demasia. Acostumados a dominar o tempo e a velocidade da internet, as pessoas desta época se desesperam quando se vêm obrigadas a viver o tempo, a velocidade e o espaço da realidade concreta.
Por tudo isso, ler está se tornando muito chato. E escrever também. Ler tornou-se uma atividade lenta, quase anti-social, que exige trabalho de construção de compreensão, o que é extremamente chato.

E as pessoas idosas, menos acostumadas à velocidade moderna e, consequentemente mais lentas nos seus gestos, para comunicar algo ou sacar dinheiro no banco? São estigmatizadas como chatas e cada vez mais mal toleradas.

Existem as mães modernas, inseridas na competição do mercado globalizado, que desejam um filho como símbolo de auto-realização, embora não suportem atividades domésticas ou maternais, extremamente repetitivas e, por isso mesmo, chatas. A desgraçada da criança vira um estorvo para a carreira profissional da mãe, pois precisa de limpeza no bumbum, troca de fraldas, receber comidinha, etc.. Por isso mesmo acabam sendo cuidadas por babás, geralmente com falhas na educação e acabam engrossando a fileira de uma nova geração de chatos, mandões, narcisistas, egoístas, individualistas, arrogantes, intolerantes, indiferentes a tudo. Adeus, etiqueta social, boas maneiras, respeito aos outros!

Os cinemas, desconsiderando aquelas grandes e luxuosas salas que exibiam filmes familiares, depois pornográficos (hoje, em fase de decadência), onde a comunidade se reunia, se encontrava para um programa, se transformaram em igrejas neopentecostais, dentro do seu próprio projeto de chatinização fanática do mundo. As salas atuais, pequenas e geralmente dentro de enormes shopping centers, atraem uma geração de mal-educados que não vão para assistir o filme, mas para comer pipoca, beber refrigerante, fazer troça das imagens projetadas na tela, conversar em alto e bom som, um sem fim de infantilidades que obviamente chateia os que estão interessados em acompanhar a história do filme. Sem falar nos telefones celulares!

A internet, que prometia revolucionar a comunicação entre as pessoas, tornando a vida mais interessante, com melhor cultura geral, despertando a criatividade, está se transformando num ambiente propício à proliferação de chatos virtuais e anônimos. São pessoas pouquíssimo interessadas na individualidade alheia, agindo compulsivamente ao espalhar pelas nossas caixas postais uma infinidade de e-mails com os chatíssimos pps ou mensagens piegas e desinteressantes. E ainda se magoam se lhes pedirmos, com a maior delicadeza possível, que evitem enviar-nos essas mensagens!

Enfim, nossa tendência egocêntrica, de fundo pré-conceituoso, nos faz achar que chatos são os outros, nós, jamais! Todo ser humano faz críticas e tem dificuldade de fazer autocríticas, sobretudo quando se refere ao nosso lado chato.

Continua no próximo post...